“O que sou então? Sou uma pessoa que tem um coração que por vezes percebe, sou uma pessoa que pretendeu pôr em palavras um mundo ininteligível e um mundo impalpável. Sobretudo uma pessoa cujo coração bate de alegria levíssima quando consegue em uma frase dizer alguma coisa sobre a vida humana ou animal.” Clarice Lispector

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Clarice...

"Escrevi livros que fizeram muitas pessoas me amar de longe." Clarice Lispector

E eu fui uma delas... Tanto que me sinto assim. Uma típica personagem de Clarice. Tendo ela sempre lendo meus pensamentos, me conta aquilo que eu sei ou que escondo de mim. Me vejo, me faço e refaço em cada eu, em cada personagem sua, oh, Clarice... Tuas palavras, capazes de representar exatamente o que eu faço e o que eu sinto no meu dia a dia. mas em suas mãos parece mais sublime.
Observo seu olhar, tão profundo.. admiram isso em mim. Mas queria ter esses olhos, de quem vê além dos olhos. vê a alma. Capaz de ler os pensamentos e fazer deles historias universais e eternas. Você não se limita ao tempo e ao espaço.
Aprendi a observar as pessoas com você. Tentar por uma simples expressão contar toda a trajetória de vida daquele ser errante, ou simplesmente tentar achar o por que de todas aquelas rugas ou aqueles dentes. Assim com o Cego foi capaz de tocar Ana, todos os dias me deixo sofrer as suas epifanias. Fico curiosa, sofro, sorrio, me preocupo, brigo e me apaixono todos os dias, quando olho pelos teus olhos. Olhos de Ana. Infelizmente muita coisa sopra nossa chama, mas quero ser capaz de acende-la todos os dias. E desfrutar do prazer da descoberta, da curiosidade e da espera por algo que eu tanto almejo.
Sua classe, seus mistérios. Ser você mesma acima de tudo. Forte em todos os sentidos. Das suas expressões faciais as suas posturas. Tragédias nunca tiraram de seu colo, sua máquina.
É um crime relacionar a vida de alguém como você, a minha vida. Mas sinto você tão próxima, tão amiga que é impossível negar. Ninguém me entende. Só você.

“[...] Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente, por exemplo, em apreender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de precoce, estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo, aliás, atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado infantil que não cresce jamais.
Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. [...] Depois, com o decorrer de mais tempo, em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem, passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza. Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado a bastante selvageria e muita timidez.
       Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar como era o amor. [...] Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo, o mistério continuou intacto. Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor, continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso, é por pudor apenas feminino.
Pois juro que a vida é bonita.”


  “Sou o que se chama de pessoa impulsiva. Como descrever? Acho que assim: vem-me uma idéia ou um sentimento e eu, em vez de refletir sobre o que me veio, ajo quase que imediatamente. O resultado tem sido meio a meio: às vezes acontece que agi sob uma intuição dessas que não falham, às vezes erro completamente, o que prova que não se tratava de intuição, mas de simples infantilidade.
       Trata-se de saber se devo prosseguir nos meus impulsos. E até que ponto posso controlá-los. [...] Deverei continuar a acertar e a errar, aceitando os resultados resignadamente? Ou devo lutar e tornar-me uma pessoa mais adulta? E também tenho medo de tornar-me adulta demais: eu perderia um dos prazeres do que é um jogo infantil, do que tantas vezes é uma alegria pura. Vou pensar no assunto. E certamente o resultado ainda virá sob a forma de um impulso. Não sou madura bastante ainda. Ou nunca serei.”



   “Eu disse a uma amiga:
       — A vida sempre superexigiu de mim.
       Ela disse:
       — Mas lembre-se de que você também superexige da vida.
       Sim.”


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